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 ARTIGOS DE FUNDO II - Cooperação, castigo e hipocrisia
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Podemos pensar que as leis morais são impostas por desígnio divino ou achar que, se são um facto natural, devem ser um produto natural da evolução sócio-biológica e, como tal, podem estudar-se cientificamente.
Depois de tudo, uma sociedade formada por uma espécie inteligente que não desenvolva regras mínimas de comportamento está condenada ao fracasso e ao desaparecimento.
A pergunta do milhão é saber como a ética ou a moral aparecem num mundo onde cada um só olha para si mesmo.
Segundo os resultados deste modelo a resposta encontra-se no modo como as pessoas interagem com os seus vizinhos mais próximos e não em sociedade.
O estudo, dirigido por Dirk Helbing, do ETH de Zurique, sugere que, sob certas condições, o comportamento desonesto de alguns indivíduos pode melhorar a sociedade.
Um bem comum, como os recursos naturais ou os benefícios sociais, são frequentemente esgotados porque o interesse de cada indivíduo ignora a sociedade ou o mundo em que vive.
O comportamento cooperativo pode ser forçado mediante o castigo, mas requer tempo e esforço por parte dos outros e estes podem deixar de aplicar as medidas de correcção. Sem estas, os oportunistas ou aproveitadores podem banquetear-se comodamente em detrimento de todos os outros e finalmente esgotar o recurso comum.
A pergunta, mais uma vez, é saber como aparece a cooperação. Foram já propostas a reciprocidade indirecta, a reputação, o castigo ou a recompensa como mecanismos que asseguram a manutenção da cooperação. No entanto, nada disto é necessário para que a cooperação floresça.
Para chegar a esta conclusão os investigadores centraram-se na ideia que os indivíduos se comportam de uma maneira racional em função de como o fazem os vizinhos, em vez de como o faz a população em geral (esta última possibilidade exige bons canais de comunicação que permitam acordos de punição, algo que não faz sentido estar presente).
É aqui que surgem as ideias de Física Estatística. A moral social, segundo este modelo, seria uma propriedade emergente, ideia que se perde noutras aproximações ao problema.
A evolução do sistema vê-se influenciada sob três volúveis: as punições que penalizam os oportunistas, o custo da administração da punição e um “factor de sinergia” que estipula quanto é melhorada a soma das contribuições individuais pela acção colectiva.
O programa escolhe um indivíduo ao acaso e calcula quanto pode ganhar em relação aos seus quatro vizinhos mais próximos dadas as estratégias empregadas por cada vizinho.
Isto é então repetido reiteradamente para outros vizinhos. A estratégia empregada por cada indivíduo é então modificada à luz do sucesso ou fracasso dos vizinhos, deste modo os indivíduos podem imitar aqueles que o fazem melhor que eles.
Depois de correr a simulação, durante 10 milhões de iteracções sob diferentes parâmetros, atingem-se resultados intrigantes. Como era de esperar, se a razão punição /custo e o factor de sinergia eram baixos então todos os indivíduos se transformavam em aproveitadores egoístas, da mesma forma que os moralistas seriam a maioria se esses valores fossem suficientemente altos.
No entanto, também se descobriu que os moralistas podiam ser a maioria mesmo que o custo de administração da punição fosse alto.
Isto devia-se à imitação dos vizinhos que mais benefícios obtinham dando lugar a domínios onde havia cooperativistas e moralistas num mar de oportunistas.
Como os moralistas enfrentavam melhor os aproveitadores que os cooperativistas, acabavam no final por dominar o sistema.
O mais fascinante é que também se encontrou uma colaboração entre moralistas e hipócritas, já que os hipócritas podiam coexistir tanto à custa de cooperativistas como de aproveitadores.
Isto acontecia quando o custo da punição era alto, as penalizações moderadamente altas e a sinergia não muito elevada. Segundo os autores este cenário é apoiado pela existência de hipócritas no mundo real (mesmo que eles os chamem “imorais”).
Segundo um dos investigadores, a contribuição da Física Estatística neste campo pode pode dar lugar a um comportamento colectivo que não pode ser obtido da análise de jogos a dois jogadores. Portanto, os modelos computacionais podem ser considerados pré-experiências que ajudem a desenhar sofisticadas demonstrações em laboratório.
A parte positiva é que este modelo prediz que a fracção de indivíduos que cooperam é maior que nos modelos lineares, onde o bem comum é proporcional à fracção dos que cooperam dentro do grupo.
Talvez isto explique que, apesar de tudo, há indivíduos que ajudam os outros.
Criado em: 18/05/2010 • 12:45
Actualizado em: 18/05/2010 • 12:45
Categoria : ARTIGOS DE FUNDO II
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