Um grupo de cientistas de diversas universidades da Grã Bretanha publicou um artigo na revista Current Biology onde se explica as origens evolutivas da liderança.
Tanto a atitude de liderar como a de submissão a um líder não são atributos únicos da nossa espécie, mas existem também noutras espécies animais.
A evolução do cérebro humano propiciou a aparição de formas mais complexas de organização social. No entanto, no momento de escolhermos os líderes, as nossas decisões conservam restos do passado evolutivo.
Por isso, levamos em conta factores como a idade, o sexo, a altura ou o peso dos candidatos na altura da eleição de um líder, asseguram os cientistas num comunicado emitido pela Universidade de Oxford.
Busca de protótipos
Mark van Vugt, do Instituto de Antropologia Cognitiva e Evolutiva daquela universidade, e um dos autores do artigo, afirma que no momento de votarmos num determinado político, por exemplo, encontramo-nos condicionados por protótipos ancestrais de liderança, que se activam em função do contexto.
Assim, se a situação é de “guerra”, desencadeia-se nos eleitores a busca de um protótipo concreto: o do líder masculino e forte.
Outro dos investigadores, Andrew King, da Zoological Society de Londres, assinala que a evolução estabeleceu princípios de liderança e submissão durante vários milhões de anos.
A combinação de observações empíricas, modelos teóricos, neurociência, psicologia experimental e genética permitiu explorar o desenvolvimento e as funções adaptativas de ambas as funções sociais.
Os resultados de análise, que combinaram ideias das ciências naturais, como das ciências sociais, sugerem que a liderança e a submissão nos humanos partilham características com a liderança e a submissão noutras espécies, o que aponta para uma origem evolutiva de ambas, assinala outro dos autores do artigo, Dominic Jonson, do Departamento de Política e Relações Internacionais da Universidade de Edimburgo.
Padrões de liderança e submissão
No artigo de Current Biology, os cientistas explicam as principais características da liderança e comparam situações da nossa espécie com a de outras espécies animais.
Os investigadores afirmam que um dos segredos universais da emergência da liderança e da submissão é a necessidade de coordenação.
Assim, naquelas espécies onde se torna mais conveniente para os indivíduos actuarem e movimentarem-se em grupo (principalmente como consequência de pressões sociais e ambientais), tendem a aparecer padrões de liderança e de submissão.
Nestas situações, qualquer característica (física ou comportamental) que aumente a propensão de determinado indivíduo “ir em frente” é o que faz com que este emerja como líder e que os outros tendam a segui-lo.
Concretamente, em todas as espécies, os indivíduos com mais propensão a líderes são os que apresentam uma característica morfológica, fisiológica ou de comportamento que os leva a actuar em primeiro lugar e a coordenar determinadas situações.
Quem manda?
Estas características seriam as seguintes: em primeiro lugar, a motivação. Aqueles indivíduos que mais necessitem de um determinado recurso são mais propensos a converterem-se em líderes.
Este facto comprovou-se em experiências com peixes sem alimento (que se transformavam em guia dos movimentos dos seus iguais em ambientes controlados) e também com zebras ou lémures, entre outros animais.
Sucede o mesmo com os humanos: quem tiver o maior incentivo para actuar, isto é, os indivíduos com maior motivação, serão mais propícios a converterem-se em líderes, explicam os cientistas.
O temperamento também é uma característica determinante da liderança, comprovada tanto em animais como em humanos. Neste último caso, demonstrou-se que ser extrovertido está mais relacionado com a emergência da liderança.
Por outro lado, o líder também pode ser o mais dominante. Assim, em espécies que formam sociedades hierárquicas, os indivíduos dominantes são os que assumem muitas vezes o papel de chefe.
Isto constatou-se em sociedades de gorilas e de lobos, e também nas sociedades humanas, onde dominar costuma valorar-se em termos de status social.
Segundo os cientistas, o facto de os homens obterem, em pesquisas psicológicas realizadas, uma pontuação mais alta que as mulheres nas avaliações de domínio e autoconfiança poderia ajudar a explicar por que hoje em dia (ainda) a liderança masculina continua a ser a norma nas nossas sociedades.
Finalmente, o conhecimento ou o grau de experiência também aumenta a tendência de um indivíduo se converter em líder e a atrair seguidores. Isto constatou-se em corvos e em certos tipos de peixes e também em humanos.
Evolução da liderança humana
A liderança teve uma grande importância na evolução humana, explicam os cientistas em Current Biology. Os líderes humanos não só promovem as acções do grupo, mas também motivam, planeiam, organizam, dirigem e controlam os seus actos.
Isto desde sempre aconteceu, de maneira democrática ou despótica, em pequenos ou grandes grupos. Mas, mesmo que existam coincidências filogenéticas entre a liderança humana e a não-humana, a expansão do cérebro deu lugar a formas de liderança únicas na nossa espécie.
A revisão dos estudos realizados até agora, constatou pelo menos cinco passos ou períodos principais na evolução da liderança humana, afirmam os cientistas.
Em primeiro lugar, a liderança emergiu em espécies pré-humanas como um mecanismo para resolver problemas simples de coordenação grupal.
Em segundo lugar, a liderança foi utilizada para organizar acções colectivas em situações conflituosas (por exemplo, para manter a paz dentro de um grupo e assegurar assim a sua unidade).
Em terceiro lugar, o acto de dominar foi atenuado nas antigas sociedades humanas igualitárias, o que propiciou a aparição da liderança baseada na democracia e no prestígio dos líderes, cuja finalidade era facilitar a coordenação do grupo.
Em quarto lugar, o aumento dos mecanismos cognitivos dos grupos sociais humanos gerou, para os líderes, novas oportunidades de atrair seguidores mediante a manipulação e a persuasão (graças às teorias da mente e da linguagem).
Por último, o aumento da complexidade social das sociedades, que aconteceu depois da revolução agrícola, gerou a necessidade de líderes mais poderosos e formais que administrassem essa complexidade, ao nível interno e externo.
Estes líderes são mais valorizados se proporcionam serviços públicos importantes e menos valorizados se abusam da sua posição ou exercem um domínio exagerado sobre os seguidores, explicam os investigadores.
No entanto, esta evolução não parece apagar de todo os protótipos de liderança anteriores, que continuam a influenciar-nos na hora de avaliarmos os líderes actuais, talvez até sem nos darmos conta.
Yaiza Martínez