Carlota e Ernesto
Numa pitoresca aldeia,
Não sei como se chamava,
Um moço jovem ainda,
Certa moça namorava.
Tinha-lhe amor tão sincero,
Como não havia igual,
Tanto que em suas falas,
Sempre lhe fora leal.
Um dia, porém, a sorte
Que nunca os quis bafejar,
Lembrou-se que não tinha meios
De com a moça casar.
... ... ... ... ... ... ...
Lembrou-se o moço coitado
De embarcar para o Brasil.
Foi ter com a namorada,
Seu projecto lhe contou;
Com as lágrimas nos olhos,
Desta sorte lhe falou:
- Deixar-te, infim, é custoso,
Anjo do meu coração;
Jura-me por tua alma,
E por tua salvação,
Que a mais ninguém no mundo
Darás o teu coração.
- Juro-te por minha alma,
E por minha salvação
Que só a ti no mundo
Dou o meu coração.
Mesmo um dia que tu morras,
Pra mim golpe tormentoso,
Juro-te por Deus que nos ouve,
Que não quero outro esposo.
- Agora vou descansado,
Já não tenho que temer;
Um dos outro nós seremos,
Mesmo depois de morrer.
Despediram-se os amantes,
As suas lágrimas viu;
Ao outro Ernesto,
Para longe terras partiu.
Passados eram três meses,
Quando n'aldeia constou,
Ernesto tinha morrido,
Quando ao Brasil chegou.
Carlota assim que o soube,
Amargamente chorou;
E negro, pesado luto,
No mesmo dia botou.
Muitos rapazes d'aldeia
De Carlota gostavam;
Sempre, sempre que podiam
De casamento lhe falavam.
Ela a todos respondia
Triste fora a sua sorte,
Que lhe dera só por esposo
A negra imagem da morte.
Mas um dia, um belo moço
Ante seus olhos apareceu;
Carlota assim que o viu,
A sua jura esqueceu.
Deitaram-se logo os banhos
Tudo enfim se preparava
Pra festejar a donzela
Que com outro se casava.
Carlota entrou na igreja
Com rosto alegre e risonho;
Mas ao ver que junto dela
Stá uma negro aspecto medonho.
Então à lembrança lhe veio
A sua jura quebrada;
Por espaço de muito tempo
Ali caiu desmaiada.
... ... ... ... ... ... ...
E quando voltou a si
Viu Ernesto ao pé dela.
- Eu não morri, estou vivo,
E rico graças à sorte;
Mas por não me seres leal,
Aborreço-te de morte.
Ernesto fez testamento,
Tudo aos pobres deixou;
E ao pé de Carlota,
Com um tiro se matou.
De Margarida Marques Pereira, minha tia, 1947