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A melhor escola do mundo
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É a hora do recreio quando chegamos à escola secundária Olarin Lukio, situada a cerca de 20 quilómetros de Helsínquia, na localidade de Espoo.


Um estudante do penúltimo ano conduziu-nos até à entrada, por um caminho coberto de neve caída na madrugada. Quando lhe perguntamos do que gosta na sua escola, diz-nos sem titubear: "Tudo!".

"Faço o que me interessa e sei que o que faço me será útil", acrescenta, revivendo em nós uma nostalgia misturada com frustração: fazíamos o que gostávamos e tínhamos uma orientação tão clara assim naquela idade e no nosso tempo?

O nosso guia despede-se prometendo ir procurar o director da escola, Tapio Erma, que nos espera para uma visita a um centro educativo finlandês. Enquanto aguardamos, passeamos pelos corredores. Vemos por ali estudantes em roupa de rua, rapazes e raparigas com aspecto amável e descontraídos.

Falam entre eles nos passadiços ou com os professores, em salas amplas, luminosas e decoradas alegremente. Não entendemos uma palavra de finlandês, mas temos a impressão que o trato é respeitoso, mas quase horizontal. Espreitamos salas cheias de computadores, salas de desporto, laboratórios de química, bibliotecas. Parece um mundo ideal.

O que no Peru [e já agora em Portugal] é imaginável mas excepcional, na Finlândia é a regra geral. Olarin Lukio não é mais que um dos cerca de 4.500 centros educativos que existem no país escandinavo.

Todos eles estão dotados da melhor infraestrutura e oferecem um clima propício à aprendizagem dos jovens. Todos eles oferecem educação de primeira, gratuita e inclui alimentação e transporte aos seus milhares de estudantes.

De um magote de estudantes surge um senhor de meia idade que nos tira do sonho. "Sou Tapio Erma, director da escola", apresenta-se.

Temos pressa em perguntar-lhe qual é o segredo do sucesso, porque sabemos que por este ambiente acolhedor, relaxado, quase lúdico, passeiam adolescentes que mostram o rendimento escolar mais elevado do planeta.

Sim, os estudantes da secundária da Finlândia podem vangloriar-se de ter batido os seus homólogos dos EUA, Holanda, Canadá e todos os demais países desenvolvidos membros da OCDE nas avaliações comparativas internacionais PISA (Programme for Indicators of Student Achievement) dos últimos anos.

ANO CHAVE

No 2003, ano da mais recente avaliação, os alunos finlandeses foram os primeiros a matemáticas, ciências e aptidão interpretativa e ocuparam o segundo lugar na resolução de problemas.

"Todos têm a oportunidade de estudar o que lhes interessa e fazem-no ao seu ritmo. É o que chamamos de escola inclusiva na Finlândia, um sistema por que optamos há mais de 20 anos e que deu os seus frutos", diz o director.

"Nós privilegiamos mais a componente de ciências na nossa oferta educativa, outras escolas de Espoo especializaram-se mais em línguas, de modo que os jovens podem escolher e sentem-se à vontade para partilhar a sua vida escolar com companheiros que têm as mesmas inclinações".

Ainda assim, como em todos os grupos humanos, não há uniformidade de rendimento entre os alunos. Mas no modelo finlandês, a diferença em relação à maior parte dos países está no facto de não se castigar nem marginalizar o estudante 'lento'.

Pelo contrário, todo o sistema está pensado para recuperá-lo e permitir que se desenvolva. "Nesta escola, por exemplo, os que rendem menos a matemática são colocados em turmas mais pequenas, de modo a que possam ter o máximo acesso à ajuda do professor. Ou incumbimos os alunos mais brilhantes de ajudar os que se vão atrasando", explica Erma.

Para este director, com 18 anos de experiência à frente de uma escola, é igualmente primordial, para uma educação de qualidade, o grau de compromisso dos professores: "Na Finlândia temos três tipos de currículos: o nacional, o local e o que é próprio da escola ou colégio. A existência deste último parece-me fundamental", considera Erma. "Ao realizá-lo, os nossos professores mantêm-se altamente envolvidos nos seus trabalhos e com os objectivos da escola".

Apesar dos excelentes resultados, os educadores da Finlândia não dormem à sombra dos louros conquistados. "Estamos conscientes dos desafios que aí vêm", assinala o director do Olarin Lukio.

A título de exemplo menciona os riscos que podem advir de um modelo que se centra na igualdade de oportunidades e no apoio aos menos capazes: "Com o tempo isto pode prejudicar o desenvolvimento dos estudantes brilhantes. Por isso estamos a evoluir de um ideal de oportunidades iguais para um sistema onde cada um possa aprender segundo as suas potencialidades".

Enquanto Erma nos leva a visitar com orgulho as instalações da escola, trocamos palavras com alguns alunos. Não têm queixas. "Os professores ajudam-nos, são compreensivos". "Não devemos fazer todos os trabalhos se não podemos". "Posso confiar nos adultos desta escola". "Aprendemos fazendo, não só ouvindo o professor".

Todos são afáveis, até mesmo quando o director se afasta discretamente para não inibir as respostas espontâneas dos jovens. Depois de insistir, só uma rapariga de 15 anos consegue mencionar uma coisa que não gosta: "A comida", diz rindo. "Sim, a comida poderia ser melhor". Não se refere à qualidade nutritiva dos almoços que se servem: "É insossa, parece de hospital", esclarece.

INVESTIMENTO COM SENTIDO

O sucesso assombroso da equação finlandesa não se gerou da noite para o dia. Reijo Laukkannen, perito e conselheiro do Ministério da Educação, sabe-o melhor que ninguém: "Temos vindo a trabalhar nisto desde finais dos anos 60 e desde o início tomamos a direcção que hoje seguimos. Um rumo que mantivemos apesar da mudança de sucessivos governos".

Laukkannen considera único no sistema do seu país o facto de se ter optado pela igualdade de oportunidades na educação: "Para os estudantes que têm problemas de aprendizagem, organizamo-nos de modo a que se colmatem as suas deficiências. Todos têm direito a ser apoiados com aulas extra ou com mais dedicação do professor".

O ano de 1985 regista um importante marco na reforma da educação finlandesa. Naquele ano o Governo decidiu eliminar o sistema conhecido como 'streaming', muito expandido na Europa, segundo o qual as crianças de idade mais avançada são classificadas em diferentes níveis e tipos de educação de acordo com o seu rendimento. "A Finlândia desfez-se deste método e abrimos todas as opções para todas as crianças oferecendo uma educação obrigatória básica de nove anos", conta o perito.

"Mas simultaneamente decidimos concentrar o grosso do nosso orçamento da educação nos primeiros anos da secundária (nos estudantes de 12 a 15 anos). Cancelar o 'streaming' sem aumentar os recursos para contar com mais professores e organizar turmas com menos alunos, numa idade em que as crianças se começam a interessar pelas raparigas e vice-versa, poderia ter baixado os níveis de rendimento. Teríamos obtido um sistema de oportunidades iguais, mas de duvidosa qualidade", explica Laukkannen.

Quando lhe perguntamos que ensino nos pode deixar a experiência finlandesa, Reijo Laukkannen responde sem duvidar: "É crucial compreender que em educação não é possível reformar de um momento para o outro. Leva tempo, muita paciência e coerência. Primeiro que nada é preciso decidir aonde se quer ir".

"A educação é como um grande navio que não é possível fazer mudar de rumo facilmente. Uma vez lançada a mudança de agulha de orientação é preciso esperar que todo o sistema tenha mudado de orientação", comenta.

"Outro conselho - acrescenta o perito - não copiem um sistema de educação alheio. Achamos que devem ser tomados em consideração o contexto económico, social e institucional próprios".

A título de ilustração, conta-nos que na Finlândia não existe um sistema de inspecção escolar: "Uma medida deste tipo arruinaria a relação de confiança existente entre o Governo e o professorado e que está sustentada na excelente formação do corpo docente. Mas num país como o Peru [e já agora Portugal] a inspecção e a avaliação são indispensáveis".

Laukkannen sabe que ao professor peruano falta preparação. "Não sou ninguém para fazer recomendações - diz com humildade - mas parece-me que no seu país urge tomar medidas para melhorar a formação dos professores".

Uma questão chave indiscutível do sucesso finlandês radica na elevada preparação dos seus educadores: todos os professores passam pelo menos cinco anos na universidade para se embrenharem na pedagogia - e nesta disciplina e numa especialidade adicional se querem ensinar nos três últimos anos da secundária.

A melhor educação do mundo em números

A Finlândia dedica cerca de 6% do seu PBI à educação. Com esta percentagem fica a meio do investimento dos países desenvolvidos. Países como a Islândia, EUA e Dinamarca dedicam 7,5% do PBI, enquanto países como a Itália, Espanha e o Japão destinam 5%. Em Portugal, 3,5%, no Peru, 3,4% do PBI.

Entre os 6 e 7 anos de idade mais de 95% das crianças finlandesas são escolarizadas. Esperam depois por nove anos de educação obrigatória: seis na primária e três na secundária.

Aos 16 anos, os adolescentes iniciam a educação secundária superior para depois aceder à universidade ou optar pela educação vocacional para aprender um ofício. Em ambos os casos, estudam mais três anos.

Para os seus 5,2 milhões de habitantes, a Finlândia dispõe de 4.433 centros educativos, 31 escolas politécnicas e 20 universidades. Quase um milhão de alunos fazem a primária e a secundária todos os anos.

As escolas são pequenas comparadas com as do Peru e Portugal. As urbanas costumam ter aproximadamente 250 alunos. Uma escola secundária considerada 'grande' pode chegar a ter entre 500 e 600 estudantes. As turmas têm 25 alunos no máximo.


Erik Struyf Palacios



Criado em: 18/12/2007 • 16:02
Actualizado em: 06/11/2020 • 15:54
Categoria : ARTIGOS DE FUNDO


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